A despeito da crítica, sobretudo a mais identificada com um certo bairrismo provinciano, acho Alberto da Cunha Melo um poeta irregular. Fraco no início, excepcional da metade para o fim de sua carreira literária. Deixou um legado de grandes poemas para a língua portuguesa. Além disso, todos os que o conheceram são unânimes em defini-lo como uma figura humana solidária, afetuosa e de uma generosidade ímpar.
Relendo agora a colossal antologia "Pernambuco, terra da poesia", editada por Antônio Campos e Cláudia Cordeiro, me deparo com Dual, poema belíssimo, onde Alberto abre o seu inventário de mortes possíveis. Como o poema é longo, deixo para degustação apenas algumas dessas mortes.
MORTO PELO MUITO
O mais, o mosto,
o gás de uma montanha
de laranjas apodrecidas;
e pelo pouco,
o bago disputado
em soluços nos calabouços;
MORTO PELA FÊMEA
que me pede uma jantar
e uma boa lembrança
e talvez peça muito;
e, pela outra
que me pede a eternidade
e talvez peça nada;
MORTO PELA VIRTUDE
essa tanga de velha
e desgastada platina;
e pelo pecado,
a notícia da única
e inexplicável
humildade de Deus;
(Alberto da Cunha Melo)
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